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Ecologia, Energia, Grandes Projetos, Hidrelétricas

Belo Monte como alvo

Não fui convidado – e.por meus próprios meios, infelizmente não tive condições de ir até Altamira – para participar da audiência pública que está sendo realizada hoje, a pedido do Ministério Público Federal, com acolhimento do Ibama, para discutir o “depois” da construção da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu. Reproduzo um debate que tive com o MPF, através das páginas do Jornal Pessoal, em junho de 2009, um ano antes da licitação que definiu a Norte Energia como construtora da obra e sua operadora. O que foi dito pode ser útil aos especialistas recrutados para o debate e para o público em geral.

PRIMEIRO ARTIGO

Não partilho a posição do Ministério Público Federal, que pediu e obteve da justiça federal a suspensão do recebimento do EIA-Rima da hidrelétrica de Belo Monte, entregue à Aneel pela Eletronorte e a Construtora Camargo Correa. O estudo e o relatório de impacto ambiental são insuficientes, de fato, para atender as exigências do licenciamento ambiental da obra.

A maior preocupação dos responsáveis pelos documentos parece ter sido mais de natureza didática, para informar o cidadão comum e influir sobre o seu ânimo em relação ao projeto, do que de aprofundamento técnico.

Mas o necessário adensamento poderá ser feito no curso do licenciamento, entre a licença provisória e a licença de instalação, até a elaboração do plano básico ambiental. Toda e qualquer intervenção no local, no sentido da execução da engenharia da obra, será sustada até que as dúvidas, questionamentos e oposições a Belo Monte tenham sido eliminadas. Ou, caso contrário, seja a hidrelétrica eliminada das cogitações.

A principal lacuna quanto à hidrelétrica do rio Xingu é a sua falta de viabilidade econômica. Até hoje os projetistas da obra não conseguiram demonstrar a lógica da sua construção. Por que submeter a grande risco um dos vales mais importantes da Amazônia, situado numa zona de tensão entre a expansão irracional das frentes pioneiras e as reservas mais próximas de recursos naturais, se não há demanda local que justifique uma usina de tal porte, para 11 mil megawatts?

A consequência desse fato é que a energia será transferida em bloco para o sul do país (ou para o Sistema Integrado Nacional, como prefere a Eletronorte). O problema é que o sistema de transmissão é muito caro, exigindo um investimento inédito, quase tão pesado quanto o destinado à geração.

Sistema que não funcionará, no sentido inverso (sul-norte) porque não haverá mercado a atender do lado de cá, mesmo que haja energia em excesso do lado de lá, em função dos regimes distintos entre as várias bacias hidrográficas do sistema integrado.

Os estudos sobre o impacto ambiental de Belo Monte deviam continuar, mas o cronograma da engenharia deveria ser congelado. Não há razão para a marcha batida que lhe querem impor a empresa estatal e a cobiçosa empreiteira privada. Há excedente de energia no país no momento e a tendência é que assim permaneça a curto prazo. Há tempo não só para examinar melhor a situação no Xingu como para acelerar novas alternativas de geração de energia limpa, como a eólica e, sob condições, a do gás natural.

Nosso modelo, os Estados Unidos, está fazendo uma severa revisão dessas fontes. O desenvolvimento da energia eólica foi incrementado: ela quadruplicou nos últimos três anos e poderá dobrar até o final de 2010 na região noroeste, a maior produtora. Ao mesmo tempo, surge uma oposição mais forte ao barramento dos rios para a produção de energia.

Dias atrás o New York Times relatou essa empreitada no sentido de desmontar hidrelétricas, como as da agência Boneville, que barraram o rio Colúmbia e o Snake, prejudicando a pesca das espécies mais nobres de salmão. Mesmo com escadas nas barragens, o peixe enfrenta dificuldades crescentes para manter o seu ciclo. Sua taxa de sobrevivência caiu muito. Há decisão judicial acusando os responsáveis pela geração de energia de não terem feito o suficiente (e possível) para evitar essa ameaça.

O debate tenta definir se simplesmente as usinas devem ser desativadas e substituídas por outras formas de energia limpa, ou se é possível conciliar os dois meios, num modelo novo. Devemos acompanhar e incorporar os benefícios dessa discussão.

O que não podemos é ignorá-la, simplesmente deixando intocável a atual matriz energética brasileira, que pretende cobrar um preço insuportável na (e à) Amazônia, mantendo métodos já superados. É o que os barragistas querem impor, sem um decidido e bem apoiado esforço para não só diversificar a geração como conservar energia e combater as perdas.

Se bem feitos e sem estarem tão umbilicalmente condicionados à construção das usinas, os estudos ambientais poderão dar boa contribuição: para antever o que pode acontecer com a construção de uma grande barragem e para perceber o que já foi feito de ruim através de outros empreendimentos, como a pecuária, a agricultura, a extração de madeira ou o garimpo. Eles são tão ruins ou piores do que uma hidrelétrica mal definida. Olhando em volta e não apenas num ponto pode-se chegar a essa conclusão.

Belo Monte: debater

antes de decidir

Na edição passada manifestei (na matéria “Belo Monte: por que a pressa com a obra?”) minha discordância em relação à decisão do Ministério Público Federal no Pará, que pediu e obteve da justiça federal a suspensão do recebimento do estudo de impacto ambiental da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu.

Tinha que discordar da ação seguinte do MPF, proposta no dia 23, contra o coordenador de energia elétrica substituto do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), Adriano Rafael Arrepia de Queiroz, por improbidade administrativa. Ele é acusado de ter validado o EIA-Rima, apesar de os estudos estarem incompletos.

Técnicos do próprio Ibama alertaram para a falta de informações nos estudos, entregues pela Eletrobrás e pelas empreiteiras Camargo Corrêa, Norberto Odebrecht e Andrade Gutierrez, principalmente em relação aos impactos sobre a população indígena e a qualidade da água. Segundo o parecer desses técnicos, o documento não supre seu principal objetivo e não atendeu os termos de referência: “informar e fornecer à população e aos agentes interessados um entendimento claro das consequências ambientais do projeto”.

Recomendaram, por isso, que o Eia-Rima fosse revisto antes de ser colocado à disposição dos interessados e ser submetido a audiências públicas. O coordenador do setor de energia, porém, recebeu os estudos, possibilitando o licenciamento ambiental prévio da obra.

Logo em seguida, o Conselho Nacional de Política Energética autorizou a licitação de Belo Monte, prevista para setembro, dentro do cronograma definido pelo governo federal como parte do Programa de Aceleramento do Crescimento, o PAC

Para os procuradores da república Felício Pontes Jr. e Rodrigo Timóteo da Costa e Silva, “não faz qualquer sentido a permissão para que se apresentem documentos faltantes no momento do aceite, para fase posterior, onde o tempo fica mais escasso para o debate, o que frauda a efetiva participação popular no debate”, segundo revelou a assessoria de imprensa do MPF.

Eles veem por trás do ato do representante do Ibama “a tentativa de se antecipar a data do aceite do EIA/Rima, a designação de audiências públicas e, por fim, o licenciamento, dentro do cronograma apresentado pelo PAC, sem considerar a legislação nacional e o respeito aos povos residentes na bacia do rio Xingu”.

Daí o pedido de improbidade para o coordenador do Ibama. Se condenado, ele poderá perder a função pública e ter seus direitos políticos suspensos por cinco anos, além de pagar multa equivalente a 100 vezes o valor da remuneração que recebe, além de poder ficar proibido de contratar com o poder público e de receber créditos ou benefícios fiscais por três anos.

Depois de ler o EIA-Rima, partilho algumas das críticas e questionamentos dos procuradores, principalmente em relação à pressa que o governo quer impor à execução do projeto, mas não concordo com o caminho que adotaram para dar-lhes consequência. Por isso, tão logo soube da nova ação do MPF do Pará, enviei a seguinte mensagem ao blog Quinta Emenda, de Juvêncio de Arruda:

A não ser que o MPF tenha informações que ainda não são do conhecimento público caracterizando a tendenciosidade do funcionário do Ibama, sua flagrante improbidade ou resistência a considerar os questionamentos do MPF sobre o EIA-Rima de Belo Monte, acho que a ação proposta  é excessiva. Li o documento e sobre ele escrevi um artigo no último Jornal Pessoal. Há lacunas, sim, mas podem ser supridas no curso do licenciamento de instalação da obra. A questão metodológica que me parece mais grave é a seguinte: como pode ser feito o EIA-Rima por quem ainda não foi escolhido para executar a obra, já que o leilão só será realizado depois do recebimento do estudo e do relatório de impacto ambiental e a concessão da licença provisória? E por que não receber o EIA-Rima se depois dele há o plano ambiental básico? E por que construir Belo Monte se até agora ninguém provou a sua viabilidade econômica, conforme, mais uma vez, mostro no artigo? De tanto absurdo, esta história está se tornando a da Alice no país das maravilhas. Ao invés de um projeto hidrelétrico, temos um desprojeto.

VOZ DO MPF

A Assessoria de Comunicação do MPF no Pará aceitou a provocação e entrou no debate com sua mensagem:

Ainda que concordando integralmente com as considerações de Lúcio Flávio Pinto a respeito da viabilidade econômica e demais inconsistências do projeto de Belo Monte, gostaríamos de oferecer aos leitores do Quinta Emenda o pressuposto do MPF no que diz respeito à aceitação dos Estudos de Impacto Ambiental e mostrar porque, cordialmente e imbuídos do espírito do debate público, discordamos de Lúcio nesse ponto.
O pressuposto de que parte o Jornal Pessoal em sua análise – sempre essencial para o MPF – é o de que os Estudos podem ser aceitos incompletos pelo órgão licenciador, que lacunas podem ser “supridas no curso do licenciamento de instalação da obra”.
O pressuposto do MPF, amparado pela legislação ambiental, é diametralmente oposto: não, Estudos de Impacto Ambiental não podem ser aceitos incompletos.

Pela Instrução Normativa do próprio Ibama que descreve o rito do licenciamento, só existem duas posições possíveis para o órgão licenciador ao analisar os Estudos: ou eles são considerados completos e aceitos, ou estão incompletos e são rejeitados.

O servidor processado pelo MPF inventou o que não existe na legislação: estudos incompletos que podem ser aceitos. Logo, feriu Instrução Normativa do próprio Ibama e cometeu sim, na visão do MPF, ato de improbidade administrativa.

situação toda se torna mais grave porque as “lacunas” em questão são os documentos sobre a qualidade da água, os estudos espeleológicos e o componente indígena, três questões fundamentais dos Estudos.

Mesmo que, hipoteticamente, o rito legal para licenciamentos pudesse ser desrespeitado (possibilidade sempre desejada por financiadores de campanha e políticos pressionados), qual seria a lógica de aceitar os Estudos para exame público se eles estão incompletos?

É por isso que o momento do aceite dos Estudos é marcante dentro do licenciamento: porque ele determina o início do prazo de 45 dias para que a sociedade analise o Eia e solicite audiências públicas.

O Eia-Rima incompleto frustra justamente a participação social – dos afetados pela obra, dos jornalistas, dos cientistas – nas audiências públicas, porque todos chegam a esse momento com o entendimento prejudicado pelas “lacunas” do Estudo.

Essa é a posição do MPF, que gostaríamos de trazer para enriquecer o debate.

MINHA RESPOSTA

Repliquei de pronto:

Dada máxima vênia, como se costuma dizer no circuito, continuo a discordar no MPF, com todo respeito. Ressalvo desde logo que meu ponto de vista não é endosso a “financiadores de campanha e políticos pressionados”, que a nota da assessoria de imprensa da Procuradoria da República aponta, nem a barragistas. Com ambos já litigava quando nenhum dos nobres procuradores envolvidos sequer havia se formado no curso de direito – e com os quais continuo a litigar, hoje, nem sempre apenas através de metáforas.

Infelizmente, o porta-voz do MPF não tratou da questão metodológica que suscitei sobre o caminho e a autoria do EIA-Rima, suficientemente ambíguo para possibilitar que gato pardo se torne preto e, como costuma acontecer, o meio-de-campo entre um ato e outro se alargue para aproveitamentos escusos, num e noutro sentido das posições assumidas de público. O EIA-Rima, tal como foi recebido, não é satisfatório, mas é suficiente para as audiências públicas. Nelas, o documento poderá ser criticado e até rejeitado.

Qual o resultado prático dessa futura audiência? A mesma de todas as outras, para tantos e tão distintos fins? Já participei de algumas e hoje participo bem menos. As audiências não têm poder decisório, são consultivas. Podem até formar opinião, mas mudarão as que os principais protagonistas já carregam consigo, algumas delas na manga?

O MPF declara que o EIA-Rima não considerou a questão indígena. Mas considerou, sim. De forma satisfatória? Não. O MPF pode apresentar sucessivas exigências, de tal maneira que o estudo antropológico nunca será satisfatório, por melhor que formal e aparentemente esteja. Isso porque o MPF parte do pressuposto de que os autores são falaciosos, escondem o jogo – como, de fato, escondem.

Só que, cumprida uma etapa preliminar, como esse EIA-Rima cumpriu, acho melhor levá-lo ao debate público nas audiências do processo de licenciamento ou, conforme o MPF pode fazer (e ainda não fez), por dispor de tal poder (que me falta e que não pretendo ter), instaurar um inquérito, em seu próprio âmbito, a partir do que surgir nas audiências e fora delas, de forma pública.

Pode até pôr em questão o mal que apontei: como é que duas empresas, uma estatal e outra privada, definem a viabilidade ambiental de uma hidrelétrica que sequer foi levada a concorrência pública? Será lícito o argumento de que, se perderem a licitação, elas ganharão uma indenização pelo que já fizeram? É assim tão olímpico, sem nada por baixo dos panos e dentro de gabinetes?

Não foi um esquema mais primitivo desse modelo que permitiu à mesma Camargo Corrêa de agora entrar como empreiteira secundária em Tucuruí e se tornar a principal – e de lá não mais sair, inclusive através de muitos aditivos, que abrangeram as eclusas, fazendo do seu dono, Sebastião Camargo, o primeiro bilionário brasileiro exatamente no período das obras, multiplicando o seu peso de US$ 500 milhões para US$ 1 bilhão (cabalísticos 20% do custo total da usina, na defasada avaliação oficial)?

Por que tomo essa posição?

Porque não temos tal oportunidade em relação às fazendas, assentamentos, garimpos e outros empreendimentos, já implantados às centenas no vale do Xingu, sem um ai de contestação e esclarecimento. Mesmo que consigamos impedir que Belo Monte saia do papel, conseguiremos impedir que esses cupins de florestas, uns menores (sob o nome de fantasia de clientes da reforma agrária), outros muito maiores, se expandam com sua voracidade irracional?

Belo Monte é uma grande ameaça concentrada. Os desmatadores individuais são pequenas ameaças multiplicadas, de maior letalidade imediata e, no conjunto, apocalípticos (o Éden secular é conversa atravessada da Bíblia). E tudo que se faz – e que se diz fazer – os conteve? Às vezes fico desalentado ao constatar que esse mundo corrosivo atrai muito menos atenção e empenho do que um paquiderme igualmente irracional, como a hidrelétrica. Às vezes fico indignado.

A razão da minha posição neste caso é que, como era simples, antes de 1981, barrar rios e neles fazer tudo o que o barragista queria, por mais absurdo que fosse, parece estar se tornando simples demais ser contra, até por mera boa intenção, combustível certo, muitas vezes, para chegar ao inferno.

Quanto mais aprendemos sobre hidrelétricas, mais queremos aprender, até solucionar a principal dúvida: elas devem ser simplesmente expurgadas por completo da Amazônia?

Aquelas de alta queda, sim, porque inundam grandes áreas. As que visam transmitir nossa energia para muito longe e deixar-nos em posição colonial, também. Se é para produzir energia, que seja para atender a necessidade amazônica, em parâmetros coerentes com sua condição natural.

Pode haver, com essas fortes condicionantes, como admitir hidrelétricas de baixa queda, sítio definido, mercado próximo, tecnologia ambiental? Para mim, são perguntas, para as quais busco respostas com tudo que minha capacidade de aprender possibilita. Não sou daqueles que já chegaram às respostas plenas e absolutas, ou a dogmas.

Por isso meu interesse em abrir os horizontes e estimular o processo coletivo de aprendizado concreto, sem preliminares estabelecidas na tábua das leis, tão pétreas na negação quanto a arrogância dos donos do poder. Certezas artificiais podem ser tão nocivas quanto incertezas oportunistas. Prossigamos na dialética, com um único pressuposto, de tutela legal: todos são inocentes, até prova em contrário.

AINDA O MPF

O porta-voz do Ministério Público voltou ao tema;

Como o debate é bom, e a argumentação sempre crítica de Lúcio Flávio Pinto é convidativa, sigamos em frente.

Gostaríamos, no entanto, de nos ater ao rito do licenciamento ambiental, que nos parece ser o único ponto de discordância efetiva.

Quando Lúcio diz: “o MPF pode apresentar sucessivas exigências, de tal maneira que o estudo antropológico nunca será satisfatório, por melhor que formal e aparentemente esteja”, ele tem toda razão.

Mas o problema nesse caso não é de satisfação com a qualidade dos Estudos, ou de exigência excessiva, porque nenhuma linha foi apresentada a respeito de temas especificamente elencados pelo Termo de Referência imposto às empreiteiras Camargo Corrêa, Norberto Odebrecht e Andrade Gutierrez.

Como poderíamos ignorar tal situação? O Ibama aceitou, das maiores empreiteiras do país, sobre a maior hidrelétrica projetada no território nacional, em desacordo com suas próprias normas, Estudos em que não consta nenhuma menção ao impacto sobre os índios citadinos, sobre os ribeirinhos da Volta Grande do Xingu ou sobre a qualidade da água do Xingu. Só para citar três impactos evidentes que há obrigação de mensurar. E que precisam ser mensurados antes, nos parece óbvio, das audiências públicas.

Se as audiências públicas em licenciamentos similares na Amazônia têm sido insatisfatórias, não mais do que jogo de cena, não existe outro caminho para o MPF além de lutar para que as de Belo Monte não repitam essa história.

Cada ilegalidade observada foi e continuará sendo combatida, não só porque essa é a obrigação do MPF, mas também porque consideramos o licenciamento como o principal instrumento efetivo de controle da sociedade sobre empreendimentos de grande impacto – ainda que, por obra justamente de ilegalidades e fraudes, raramente se tenha efetivado esse controle.

Foi cumprindo a obrigação de vigilância que, em 2001, o MPF pediu e a Justiça impediu que a Usina fosse licenciada pela (então) Sectam, como queria a Eletronorte. A batalha jurídica foi prolongada, mas estabeleceu a premissa em definitivo, e o licenciamento passou a ser feito pelo Ibama.

A mesma vigilância, nova ação judicial, e já em 2008, impedimos que as três maiores empreiteiras do país incluíssem uma cláusula de confidencialidade (!) sobre os Estudos de Impacto Ambiental de Belo Monte. E esperamos, agora, impedir a aceitação desses mesmos Estudos, enquanto estiverem incompletos em questões fundamentais.

MEU COMENTÁRIO FINAL

Há quase 20 anos defendo a tese de que o desenvolvimento da Amazônia devia ser promovido através das bacias hidrográficas e não seguindo a diretriz das rodovias. Os vales dos rios deviam se tornar objeto de planos de desenvolvimento, no seu sentido mais amplo. O plano seria transformado em lei, através de votação pelo legislativo, passando a ter caráter compulsório. O barramento de rios para geração de energia seria um dos usos múltiplos previstos e descritos nesse plano.

Os estudos de impacto ambiental das obras que fossem sendo executadas seriam realizadas pelo poder público. Para financiá-los, seria constituído um fundo, a partir de um percentual de algum tipo de tributo (podia ser sobre a cobrança da energia, sobre royalties ou compensações). O governo contrataria consultores, através de licitação pública, para preparar os termos de referência.

Depois, também através de concorrência, selecionaria a universidade que realizaria os estudos de viabilidade ambiental, desde que estivesse provada a viabilidade econômica do empreendimento, em etapa anterior e paralela desse percurso, no nível governamental competente. Antes de ser levado a audiências públicas, o EIA-Rima seria submetido a teste de consistência perante um conselho formado por representantes das universidades públicas brasileiras, com mandato de dois anos, sem reeleição imediata.

Só em seguida, passando pelas duas etapas, o EIA-Rima iria para o Conselho Nacional (ou estadual, conforme o caso) de Meio Ambiente para o licenciamento, em suas sucessivas modalidades, até o início das obras de engenharia.

Acho que essa proposta, sujeita ainda a críticas, atenderia os pontos convergentes e divergentes da polêmica com o Ministério Público Federal. Os leitores concordam? Então que entrem no debate, necessário e urgente.

Discussão

7 comentários sobre “Belo Monte como alvo

  1. Comparando com o desmonte da quadrilha que desmatava (e enriqueceu), extensas porções da floresta amazônica no estado do Pará, a obviedade dos interesses no potencial gerador de divisas energéticas intrínseco da Amazônia, despertou, desperta e sempre desperta-rá a cobiça de empreendedores, subsidiados ou não pelas benesses do governo.

    Mas, é singular admoestar a consciência no sentido de compreender as artimanhas do enredo que envolve a construção de Belo Monte. Seria, apenas a obstinada vaidade dos técnicos e engenheiros em provar a possibilidade da implantação do projeto? Ou, como ante previsto diante do “esforço” dos governos Lula e Dilma, (agora comprovada pela Operação Lava Jato) servir como fonte, propinoduto à políticos?

    O fato é que a construtora comemora a sétima turbina liberada para gerar energia comercialmente, e de maneira pragmática avança nas etapas previstas do projeto, sobrepondo contestações jurídicas, ou tendo que acatar decisões.

    Voltando a posicionar quanto ao “Comentário Final”, suas propostas Lúcio, poderiam seguir como texto para sugestão de serem inseridas em propostas de modificações de normas ou leis ambientais, contemplaria posicionamentos para projetos de leis ou até novas emendas.

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    Publicado por Thirson Rodrigues de Medina | 11 de novembro de 2016, 13:57
    • Lúcio,

      Sempre é bom rever a história postando novamente os seus artigos. Somente assim as pessoas podem ter a perspectiva de que não foi por falta de conselho e de manifestações contrárias que a obra máxima do Lulo-Dilmismo foi construida. No final das contas, nós que fomos os ingênuos ao pensarmos que com críticas técnicas e apoio popular conseguiriamos reverter a situação. Tudo era irreversível desde o início. O objetivo final sempre foi o de gerar propinas para alimentar as vitórias eleitorais da coligação PT-PMDB.

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      Publicado por Jose Silva | 11 de novembro de 2016, 14:04
    • Obrigado por suas corretas observações, Thirson. Infelizmente, existe uma estratégia de fazer ouvidos de mercador a críticas, ponderações e sugestões como estas. Quem pratica os atos age rápido para que os fatos consumados se imponham.

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      Publicado por Lúcio Flávio Pinto | 11 de novembro de 2016, 16:39
  2. O Simonsen disse que, para o bem do Brasil, muitas vezes era melhor pagar a propina e não fazer a obra.

    Não sei se aplica a Belo Monte, mas que ele tinha razão, isso tinha.

    Em tempo:
    Lúcio,
    Já escrevi aqui que leio os comentários sem identificar previamente os autores.
    Não tenho errado muito não, se é que vc me entende.

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    Publicado por Sou daqui. | 11 de novembro de 2016, 17:26

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