Só jornalistas de linha de frente são capazes de bem avaliar a importância de Raul Martins Bastos para a imprensa brasileira contemporânea. Raul foi – e continua a ser, agora na publicidade – o mais competente jornalista de retaguarda que conheci e com quem tive a honra e a felicidade de trabalhar, sobretudo em O Estado de S. Paulo.
Ele é aquela pessoa que, na sede do jornal, orientava e animava o repórter deslocado como enviado especial a alguma paragem do país ou do exterior. Não apenas com sua acuidade e verve, mas também com uma generosidade rara e um entusiasmo vital.
Dessas qualidades ele dá provas na mensagem que acaba de enviar aos amigos e colegas, entusiasmado por uma vitória pós-morte de Reali Júnior, autor de reportagens memoráveis, principalmente a partir da sua base, em Paris. A mensagem foi dirigida mais especificamente à viúva, Amélia. Mas merece ser dividida com meus leitores.
A Eternit anunciou finalmente e oficialmente que vai deixar de usar amianto em todos os seus produtos. As consequências da contaminação por amianto são atrozes, mas mesmo assim a empresa continuou a usá-lo por questão de custos até ser colocada na parede pela opinião pública, a partir das denúncias do Reali.
Após anos e anos de discussões judiciais protelatórias a Eternit se rendeu e anunciou que vai suspender em 2018 o uso de amianto na fabricação de todos seus produtos no Brasil. Não é por bom mocismo. É uma exigência do mercado e dos consumidores.
“Entendemos que o mercado não quer mais consumir produtos com amianto no Brasil”, diz o presidente da empresa.
O Reali foi quem primeiro denunciou os terríveis malefícios do amianto para a saúde dos trabalhadores e dos consumidores. Ele não se intimidou, apesar das pressões e das ameaças de gente muito poderosa, aguentou o tranco e não desistiu. Tanto fez que o governo e o Judiciário – que faziam cara de paisagem – tiveram que se posicionar timidamente, a bem da verdade, mas o assunto entrou na pauta da sociedade.
Diante o enorme perigo que representava para a saúde das pessoas nos países sérios o uso do amianto já tinha sido abolido há muito tempo e até mesmo retirado e substituído em todos os lugares em que ele tinha sido empregado, dos edifícios aos barcos de guerra. Aqui continuava sendo usado criminosamente. Aqui poderia continuar fazendo vítimas e lucrando. O Reali disse não.
De tanto insistir o Reali foi conseguindo avanços. Timidamente, aqui e acolá alguns poucos estados decidiram banir o amianto depois da sociedade acordar, se posicionar e rejeitar o amianto, que fez um sem número de vítimas fatais no Brasil. Foi uma bola de neve que termina agora com a rendição final da Eternit (que, por sinal, nem pagou as inúmeras multas que sofreu durante esse tempo todo, pois é).
Então, Amelinha estou aqui dividindo com você e com os companheiros do velho Estadão (que a bem da verdade topou a briga) minha satisfação e orgulho de ter como companheiro um profissional da qualidade, ética e coragem como foi o Reali. Mesmo depois de morto ele nos dá alento para continuar acreditando na força do jornalismo sério, responsável e compromissado com a verdade Além, é claro, de uma enorme saudade do Reali que é a mesma que sinto do Saul.
O REALI VIVE. VIVA O REALI.
Um beijo do Raul Bastos e de todos nós.
Pai d’égua!
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Reali era bom. Pena que levou todo este tempo para banir o amianto de uma vez por todas. Quantas pessoas foram contaminadas neste período. Quem pagará a conta? Triste, muito triste!
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Excelente matéria, LFP! E grande demonstração de condução ética no agir e fazer Jornalismo. De mãos dadas c/ movimento global por uso, fabricação de produtos e consumidores conscientes, tida cadeia produtiva. Importante Precedente p/ formação jurisprudência acerca dos tão invisíveis Princípios da Prevenção e Precaução.
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