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Justiça, Política

Brasil no vácuo

Por 6 votos contra 5, em 2016, o Supremo Tribunal Federal adotou o entendimento de que a pena de prisão de um réu poderia começar a ser cumprida com a confirmação da sentença condenatória pelo 2º grau de jurisdição, o órgão colegiado que aprecia os recursos apresentados contra o juiz singular. Pelo mesmo placar, três anos depois, o STF voltou atrás, devolvendo a legalidade da prisão para o trânsito em julgado, quando são esgotados todos os recursos, que, em matéria penal, podem somar algumas dezenas ou, em situações extremas, quase uma centena.

O que aconteceu de mais relevante – ou mesmo inédito – entre as duas datas no Brasil? Pela primeira vez, os criminosos de colarinho branco foram processados pelos crimes de corrupção. E – para pasmo geral – não só foram conduzidos ao cárcere, como nele, pela primeira vez ficaram presos, apesar de algumas ordens superiores de soltura, dadas pelos mesmos ministros de sempre da corte suprema, na porta da cadeia, em favor – sempre – dos “mais iguais”.

Nessa caça aos corruptos, que sangraram a maior empresa do país, a Petrobrás, a esquerda reapareceu na posição de corrupta, no segundo ato, ampliado e  aprofundado, depois do mensalão. Não a esquerda tradicional, decisiva na crítica, na oposição e na avaliação do país, mas a que assumiu o comando das rédeas do poder ao longo de 14 anos seguidos, nos últimos seis conduzido pela inacreditável Dilma Rousseff, aquela que nunca soube onde estava ou o que dizia e fazia, mas que Lula insistiu em tornar sua sucessora (ou esquentadora da cadeira que deveria voltar a ocupar).

Essa associação, nem sempre racional ou meramente intelectual, também gerou outro fato novo na história nacional: pela primeira vez um político declaradamente de direita, de origem sombriamente militar e medíocre carreira política, com um discurso progressivamente fascista, foi eleito pelo povo, em função da evolução da Operação Lava-Jato e do papel destacado de um juiz federal, o paranaense Sérgio Moro, mas também da dissipação das energias alternativas pelo pregão do Lula Livre”, um cantochão que ameaçava reencenar o que foi drama e tragédia em farsa, como preveria Karl Marx, repetindo – e ajustando – a avaliação que fez da Comuna de Paris.

Razões a favor e contra as duas decisões são abundantes e, em muitos casos, extremamente polarizadas. Um artigo da constituição e outro do código penal fecundaram uma controvérsia que não parece ter fim. Nessa dinâmica, a divergência caminha em paralelo em busca do infinito. Por ser absoluto o ponto de chegada, essa corrida de diferenças gera a intolerância, as paixões, os combates, uma guerra – inútil.

Sem entrar nessa cornucópia, que pode extremar ainda mais a ação política no Brasil num rumo imprevisível (ou de sombria previsibilidade), acho que alguma coisa de básica resistirá a esse embate de falanges irracionais.

Um fato é que textos legais capazes de engendrar tantos pontos de vista opostos e contraditórios não têm a objetividade que lhes é atribuída, numa e noutra interpretação. Impõe-se um novo trabalho legislativo, seja no nível constitucional quanto na legislação inferior.

O Brasil precisa rever as suas instituições, ou algumas delas, que foram minadas e perderam credibilidade e confiabilidade, como o Supremo Tribunal Federal. Decidindo sobre matéria tão grave com duas votações tão apertadas, o STF se revela incapaz de ser o intérprete da constituição, ou essa constituição possui tal inconsistência que não serve mais de fundamento para orientar a dinâmica – principalmente os litígios – da vida pública brasileira. Apesar das longas sessões de debates sobre  as demandas jurídicas, parece que os loquazes ministros agem mais nos bastidores do que no plenário, mais suscetíveis à conjuntura do que a substância das estruturas institucionais.

O Brasil está de volta ao vácuo.

Discussão

8 comentários sobre “Brasil no vácuo

  1. Essa questão da segunda instância tem que ser resolvida é pelo Congresso Nacional.
    Esse STF está muito contaminado com Ministros agindo de maneira parcial hora decidindo por ideologia hora para pagar favor de quem os indicou.
    Uma Tremenda Vergonha.

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    Publicado por cliff | 9 de novembro de 2019, 12:33
  2. Achei tudo uma grande cachorrada. Essa atitude do STF vai levar o país à radicalização.

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    Publicado por Ademar Amaral | 9 de novembro de 2019, 14:39
  3. é o brasil cuja subcidadania faz por merecer, com bandidos soltos tanto na “esquerda” quanto na “direita”, todos bandidos do capital…

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    Publicado por felipe puxirum | 9 de novembro de 2019, 16:04
  4. Lúcio, o jornalista Hélio Schwartzman, em sua coluna, “Constituicao Viva”, Folha de hoje, faz uma análise sobre o nosso STF.
    Diz: “… o problema não é tanto a mudança de orientação, mas a frequência com que ela ocorre. Cortes constitucionais, afinal, tem não apenas a missão de compatibizar a Carta com o presente, mas também a de fazê-lo preservando a estabilidade jurídica. Dar uma guinada de 180 graus apenas 3 anos após a decisão anterior pararece-me precipitado”.
    Eu, aprendi há mais de 50 anos na velha Faculdade do Largo da Trindade, com um dos maiores constitucionalista do Brasil, mestre Orlando Bitar que o STF é o intérprete da Constituição.
    Como muitas decisões que envolvem a política atua tem o resultado de 6×5, me pergunto se estão vigentes 2 Constituições?

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    Publicado por Ronaldo Passarinho | 9 de novembro de 2019, 16:40
  5. O Congresso é o vilão desse novo capítulo da discussão e o judiciário (STF) demonstra que em 2016 a decisão teve rumo e diração (Lula e eleição para presidente). Simples.

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    Publicado por Laudyson JBA | 9 de novembro de 2019, 17:01
  6. Lucio, o mecanismo está a funcionar. A Constituição da impunidade, conhecida como “cidadã” foi criada com esse objetivo. Zilhões de direitos e poucos deveres. Obviamente quem tem condições, locupleta-se. Como revelou o incompreendido Figueiredo, ao indagar a um político civil: “E o povo? “. Ao que o interlocutor não revelado pelo nobre cavalariano, respondeu: “Ah, o povo, presidente?”.

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    Publicado por jjss555js | 9 de novembro de 2019, 20:23
  7. Quando decidiram pela prisão dele, estava tudo lindo, né? Mesmo com 1 processo cheio de falhas e com claros sinais de arbitrariedade, era a Justiça sendo feita. Agora que tá livre, tem que mudar tudo, o STF não presta e etc.

    Cada dia mais você se supera. Cuidado para não terminar se juntando aos velhos fascistas que pedem fechamento de tudo.

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    Publicado por Fábio | 10 de novembro de 2019, 00:57

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