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Governo, Política

Haverá amanhecer?

Como o Brasil amanhecerá na segunda-feira? O mesmo de antes da exibição da íntegra (quase) do vídeo da reunião ministerial de 22 de abril? Ou será um outra nação? Como o mundo passará a ver o oitavo país mais extenso, populoso e rico do planeta (ao menos em potencial de grandeza, sobretudo pelos seus vastos recursos naturais)?

Já é ruim o conceito do Brasil no trato com a maior ameaça mundial do momento, a pandemia do coronavírus. Em pouco tempo, o país foi superando os que estavam à sua frente nos casos registrados da doença e nas mortes que causa. Somos o terceiro do mundo, o único, no topo do ranking, em que a curva continua ascendente.

Estamos a apenas dois mil casos do 2º país colocado, mas temos seis vezes mais mortos do que a gigantesca Rússia. São Paulo, nossa maior e mais rica cidade, é a 13ª em casos e a 9ºª em mortes do mundo.

Por ter começado mais tarde, não ter adotado uma política unificada de combate ao vírus e ter perdido eficiência pela interferência política e velhos miasmas sociais, como a intensa corrupção, o Brasil trouxe o epicentro da covid-19 para a América do Sul, concentrando quase 60% da incidência da doença. Das 29 mil mortes registradas no continente, 21 mil aconteceram no Brasil.

Ela seria motivo suficiente para que o país se empenhasse em superar suas limitações e tentasse recuperar o tempo e a racionalidade perdidos a fim de salvar vidas, ceifadas às centenas todos os dias

Como se não bastasse, surpreendemos e chocamos a nós mesmo (e ao mundo, mais ainda) com o espetáculo grotesco, escatológico e selvagem da reunião da cúpula do governo central na sede do poder executivo federal, em Brasília.

Os trechos que poderiam criar um novo – e mais grave – incidente diplomático, com as referências levianas à China, o próprio ministro Celso de Melo, que liberou o vídeo, mandou censurar. Mas pelo tom geral da esbórnia presidencial, os países que têm relação com o Brasil poderão medir o grau do absurdo, que enterrou a diplomacia criada com tanto esforço e competência pelo barão do Rio Branco e seus sucessores.

Revendo o que foi dito verbalmente na sua transcrição impressa, o espanto não tem limites. Só para refrescar a memória dos que amanheceram ainda aturdidos, reproduzo uma seleção feita por O Estado de S. Paulo, com um toque de alteração para reproduzir na íntegra os palavrões, que o jornal camuflou:

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A menção à PF aparece em trecho em que o presidente diz não poder ser “surpreendido com notícias”. “Pô, eu tenho a PF que não me dá informações. Eu tenho as inteligências das Forças Armadas que não tenho informações; a Abin tem os seus problemas, tenho algumas informações. Só não tenho mais porque tá faltando, realmente, temos problemas, pô! Aparelhamento etc. Mas a gente não pode viver sem informação.”

O mandatário também disse na reunião que já tentou, sem sucesso, trocar sua segurança no Rio de Janeiro, e que agora “isso acabou”. “Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro, oficialmente, e não consegui! E isso acabou. Eu não vou esperar foderem a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa. Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra brincadeira.”

Em uma de suas falas, o presidente afirmou que não vai “enfiar o rabo entre as pernas” se decisão do STF tentar impedi-lo de circular pelo País. Celso de Mello, decano da Corte, advertiu o chefe do executivo em sua decisão de 55 páginas que descumprimento de decisões judiciais configura “crime de responsabilidade”.

Os ministros do governo de Bolsonaro também tiveram suas falas reveladas em vídeo. Damares Alves, ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, defendeu prender governadores e prefeitos após a pandemia. O ministro da Educação, Abraham Weintraub, falou em prisão dos ministros do STF, conduta que Celso de Mello apontou como ‘aparente prática criminosa’. Ricardo Salles, do Meio Ambiente, sugeriu aproveitar o foco da mídia na pandemia para fazer mudanças na lei ambiental. Abaixo, confira os principais trechos da reunião ministerial de Bolsonaro.

Bolsonaro diz que não vai ‘enfiar o rabo entre as pernas’ em relação ao STF

Presidente afirmou que se o STF tentar impedi-lo de circular no País, terá “uma crise política de verdade” e ele não vai “enfiar o rabo entre as pernas” em eventual decisão judicial sobre o tema. Durante a reunião, Bolsonaro ainda defendeu sua ida em manifestações antidemocráticas, afirmou que ele é o chefe supremo das forças armadas e pregou armar população para evitar ditadura

Ricardo Salles diz que governo deve aproveitar pandemia para ‘ir passando a boiada’ em medidas regulatórias

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, declarou na reunião que é preciso aproveitar a “oportunidade” que o governo federal ganha com a pandemia do novo coronavírus para “ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas”. Segundo Salles, a cobertura da imprensa focada em covid-19 daria “um pouco de alívio” para a adoção de reformas infralegais de regulamentação e simplificação. De acordo com o ministro, o Meio Ambiente é “o mais difícil” de passar “qualquer mudança infralegal” porque “tudo que a gente faz é pau no Judiciário, no dia seguinte”.

Damares defende prisão de prefeitos e governadores 

A ministra Damares Alves defendeu a prisão de prefeitos e governadores após a pandemia do novo coronavírus . Segundo ela, a maior violação de direitos humanos da história do Brasil nos últimos trinta anos está acontecendo neste momento e o ministério vai começar a “pegar pesado com governadores e prefeito”. A ministra também criticou o STF e falou que é “palhaçada” a Corte trazer o aborto de novo para a pauta. “As mulheres que são vítima do zika vírus vão abortar e agora vem do coronavírus? Será que vão querer liberar que todos que tiveram coronavírus poderão abortar no Brasil? Vão liberar geral?”, afirmou a ministra.

Weintraub: ‘Botava na cadeia esses vagabundos todos, começando pelo STF’

Ministro da Educação, Abraham Weintraub, disse durante a reunião que “botava na cadeia” todos os ministros do STF. “Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia. Começando no STF.” O relator do inquérito no STF, ministro Celso de Mello, considerou que Weintraub cometeu possível crime em sua fala.

Paulo Guedes defende venda do Banco do Brasil

Ministro da Economia disse “tem que vender essa p* logo” em referência ao Banco do Brasil. Segundo ele, o governo faz “o que quer” com a Caixa Econômica Federal e o BNDES. Já no BB, disse que “a gente não consegue fazer nada” e “tem um liberal lá”, o presidente Rubem Novaes. Na reunião do dia 22, Guedes ainda expôs desentendimentos com integrantes do governo que defendiam um programa de obras e investimentos públicos para solucionar a crise gerada pela pandemia do novo coronavírus. Entre eles, Guedes citou a “digital” do ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho.

Ernesto Araújo fala em ‘nova ordem mundial’ sem ‘país não democrático’ no ‘centro da economia’

O ministro das Relações Exteriores disse acreditar que haverá uma “nova ordem mundial” após o fim da pandemia de coronavírus. Segundo ele, não poderá ter “um país que não é democrático, que não respeita direitos humanos” no “centro da economia internacional”, possivelmente se referindo aos chineses. “Eu tô cada vez mais convencido de que o Brasil tem hoje as condições, tem a oportunidade de se sentar na mesa de quatro, cinco, seis países que vão definir a nova ordem mundial”, declarou o chanceler.

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Os participantes da reunião liberaram a linguagem por imaginarem que jamais a gravação seria revelada?

Mesmo que temesses essa circunstância, excluídos os excessos verbais, disseram o que realmente pensam, sem censura, mesmo com todas as implicações de declarações injuriosas para com os demais poderes republicanos e outras autoridades públicas?

Bolsonaro jamais considerou a hipótese da divulgação do vídeo ou essa hipótese estava na sua consideração e pode até ter sido desejada por ele?

Quando afirma que não entregará seus aparelhos celulares, mesmo sob ordem judicial, ele aposta no confronto, por mais grave que seja?

Com suas atitudes desrespeitosas e levianas, Bolsonaro está blefando ou tem um ás de ouro escondido na manga?

Os generais presentes ao acontecimento representam o exército e as forças armadas?

Dirigindo a sua mensagem aos milhões que ainda o apoiam, Bolsonaro espera que eles radicalizem ainda mais as suas posições e se tornem autênticas milícias, à semelhança das SA de Hitler?

Como reagirão os humilhados e ofendidos?

O Brasil de segunda-feira reagirá com brio na defesa da democracia, das instituições e da normalidade?

O lance de Jair Bolsonaro pode levar a um episódio como o do putsch de 1923 em Munique, na Alemanha?

O futuro é agora. Ou não haverá.

Discussão

13 comentários sobre “Haverá amanhecer?

  1. Mas como fazer isso Lúcio, sem poder sair de casa? Aí está um problema muito sério. Infelizmente teremos de esperar pelo submisso PGR Augusto Aras, ou pelo Congresso Nacional, onde o capitão boçal ainda tem algum apoio. Aliás, seria permitida a votação de Impeachment à distância? Sequer os deputados podem ser reunir. Ainda tenho esperança de que os generais sensatos das forças armadas convençam o presidente a renunciar. É notório que esse desequilibrado está “queimando o filme” dos militares,como se diz no popular.

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    Publicado por Rafael Araújo | 23 de maio de 2020, 11:14
  2. Veremos mais notas de repúdio em vez de ação. Só.

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    Publicado por brunooromao | 23 de maio de 2020, 12:38
  3. É natural e esperado: quando conhecemos uma história queremos que ela nos toque profundamente. E como conseguir senão lendo sobre heróis, vilões e grandes momentos? Quando lemos sobre a Ditadura militar lemos sobre guerrilheiros, generais, torturados e bastidores de poder. E o cidadão comum? O pobre, a pessoa de classe média? Um general na tv, um professor que falou algo político e no dia seguinte não veio à aula, uma batida policial no ônibus que prendeu um jovem e um dos policiais disse que o mesmo era “terrorista”, e os preços do feijão e do da batata continuam um absurdo…
    Que diferença faz uma ditadura em um país violento e composto de cidadãos de papel?
    Falar sobre “democracia” e “liberdade” é bonito e será sempre sempre algo poderoso, mas há momentos que é preciso ir além das palavras.

    Abraços,
    Aldrin.

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    Publicado por Aldrin Iglesias | 23 de maio de 2020, 13:27
  4. Lúcio,
    Tu mesmo já admitiste que esse é o pior governo que o Brasil já teve.
    E ninguém, com um mínimo de honestidade intelectual, pode alegar que o Bolsonaro não está fazendo exatamente o que já apregoava na cammpanha presidencial e o que se poderia esperar dele caso fosse eleito.
    O Haddad, por pior que fossem os erros capitais cometidos pelo PT, nem de perto estaria realizando uma gestão tão nefasta e com um risco tão candente à nossa já frágil democracia.
    Não sou petista, mas não me foi possível outra escolha que não pelo menos pior.
    Agora, que as claras e gritantes profecias se concretizam, é fácil jogar a pedra, mais infelizmente, não só quem pariu Mateus agora tem que o embalar, mas sim todos nós.
    Estamos pagando pela escolha de uns e pela omissão de outros.

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    Publicado por João | 23 de maio de 2020, 17:01
  5. Ernesto Araújo acha que o Brasil vai sair maior. Que o Brasil vai sair com um diferencial depois de tudo isso. Vai ser uma das potencias entre os demais países. Como isso acontecerá eu não sei. O Olavista realmente parece acreditar no que fala. Pode não haver nada de ilegal em tudo isso, mas para as pessoas com senso critico parecemos estar realmente no funfo do poço. Já os críticos de direita parecem ter desaparecido daqui.
    Humildemente peço uma critica sobre Ricardo Salles e a politica ambiental, onde o ministro já havia isentado desmatadores de áreas da Mata Atlântica uma vez que considera a região com ambiente florestal “consolidado”, não afetando assim seu ecossistema não deveria haver multa (????). Agora aproveitaria a ocasião para por em pratica sua agenda através de medida provisoria (Seria essa a politica de governo que Aras e a AGU estariam falando para tentar proteger o governo, assim como a de Guesdes tentando vender logo de vez o BB).

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    Publicado por Fabrício | 23 de maio de 2020, 23:42
  6. Pois é.
    Quem mandou falar somente mal do PT? Hoje o Presidente poderia ser o Professor Haddad mas a cantilena tipicamente de classe mérdia sobre corrupção levou a isso.

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    Publicado por Hélio Mairata | 24 de maio de 2020, 07:37
  7. Bom dia para todos.Importante o comentário do João.Infelizmente, também fui obrigado a votar no poste do ex-presidente condenado.Ao que parece(não resido em São Paulo)o senhor Haddad realizou uma péssima administração na capital paulistana.Também votei aqui no estado no filho do Barbalho,perpetuação dessa oligarquia no Pará.No primeiro turno escolhi outros candidatos,mas no segundo(por culpa dos outros) não havia muita opção.Na eleição para presidente ou era o Haddad ou o desequilibrado mental.E Lúcio,para não dizerem que apenas falo de flores no teu blog,muitos devem me ver como um adulador dos teus artigos, venho te fazer uma cobrança.Geralmente tu defendes o voto branco ou nulo porque nenhum candidato te agrada.Entretanto, temos de ter posicionamento na vida.Meses atrás,no março chuvoso do alagamento,apregoaste que em outubro deste ano(não deve ser mais em outubro devido à pandemia)a população deveria dar uma resposta ao desgoverno do senhor Zenaldo. E agora eu te pergunto:vais fazer tua parte nas eleições,mesmo não sendo mais obrigado a sufragar?Anular o voto é um direito teu,mas não resolve nada,até ajuda a eleger os piores.Não precisas vim aqui dizer em quem votaste,já que voto é secreto.Entretanto, lá naquele minuto reservado na urna eletrônica,não dá para ficar em cima do muro.Espero que você não se chateie com esta cobrança civilizada.Tenha uma ótima semana e fique bem.Melhoras para a tua saúde,como sempre desejo.

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    Publicado por rafael gomes araújo | 24 de maio de 2020, 08:29
  8. Aos adeptos do Bolsonarismo aquela linguagem não estranha, mas simplesmente empolga. A linguagem inapropriada é simplesmente aforma que tenta torna mais autentica é próxima da barbárie e anarquia anti-civilizatória. Está no amago do ser humano que todos passam e é uma tentativa captar ou aproximar do humano imperfeito e raivoso diante dos freios que a instituição tem quando não é possível sua vontade. Nisso define bem seus inimigos e culpa o outro pelos problemas.
    O discurso ideológico colocando valores religiosos, de patrióticos e familiares como base. Questiona o alinhamento com o governo e suas proposta a qual todos devem seguir, assim como mostrar uno um governo que não pode ser elogiado em parte, mas sempre será o todo. Tal como Abraham Weintraub diz ao falar de povos, palavra que diz odiar e não aceitar, mas somente há o povo brasileiro. Não há o individuo, mas o bolsonarista e o partido com as ideias já feitas, o totalitarismo perfeito.
    Os que ficam calados, como Teich e Moro, ora balançam a perna e fecham o rosto mostrando um nervosismo e certa inconformidade com tudo isso. Os que se manifestam imitam o chefe e repetem palavrões e impropérios. Todo discurso é reafirmado por ministros ideológicos como Ernesto Araujo que põe esperança no caminho traçado. De Weintraub que reafirma os inimigos, assim como Damares que acusa medidas drásticas (que não estranha Helder Barbalho ser acusado com ação federal, bolsonaristas já mostram imagens do pai sendo preso).
    São os Olavistas mais alinhados que vem a oportunidade de mostrar o alinhamento e reafirmar esse patriotismo anti-esquerdista. Falam em aproveitar a politica para aplicação o caos para aplicar sua agenda liberal com privatizações (a do Banco do Brasil) ou fazer passar suas ações politicas, como Salles. Não politicas contra pandemia, mas pelo contrario aproveitam a preocupação da população para evitar a imprensa e as instituições. Não é o fato de ser uma agenda anti-popular, mas anti-transparente, anti-midiática e anti-democrática. Não querem ouvir o contraditório, o posto ou os questionamento, sabem a sua verdade e seus debates buscam apenas ganhar e que os outros são inimigos que querem golpear (o golpe, no caso) e derrubar um governo que diz que foi eleito democraticamente (sem se afirmando isso), a mídia sempre vai ser inimiga a ser combatida ferozmente.
    Mas esse discurso é empolga o eleitor de Bolsonaro reafirmando todas palavras de ordem e todo extremismo politico que se intitula de direita. Parece propositalmente feito a este público. Mostra que está de acordo com o bolsonarista mais revoltado que sai as ruas e apresenta cartazes contra as instituições. Que apesar das aparências da serenidade o governo de verdade é aquele que fica no twitter e discursa atacando as demais poderes.
    Se a historia mostra as similaridades as coisas tem suas particularidades e não se repetem como um todo. Assim como foi preciso se alistar em um partido embarcando no Partido criado por Anton Drexler, quando não sua oratória conseguia empolgar e ganhar mais força e aparecem embates dentro do DAP negociações seriam feitas e o criador do próprio partido seria expulso. Não diferente Bolsonaro tentou fazer quando tentou tomar conta do PSL, já houveram muitas historias com outros personagens e outros partidos, mas Bolsonaro não conseguiu. Também o fato de o partido ter um excelente publicitário, a publicidade atual mudou e se um lado as fake news de Carlos Bolsonaro ajudaram a criar o presidente, não mantiveram a agregação e consolidou um público maior. Acho o fato da humanidade ter vivido esses freios e contrapesos colocando peso a demais instituições criando pesos e contra-pesos fez com que a democracia se torne um pouco mais forte. Fossem outros tempos teríamos um outro Fuhrer.

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    Publicado por Fabrício | 24 de maio de 2020, 11:39

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