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Ecologia, Floresta

A história na chapa quente (350)

Desmatamento recorde:

a triste marca brasileira

(Publicado no Jornal Pessoal 331, de outubro de 2004)

A edição de 2005 do Guiness, o livro dos recordes, sairá no próximo mês atribuindo ao Brasil  o maior índice de desmatamento do planeta, segundo informação fornecida na semana passada pela Radiobrás.  A polêmica publicação reproduzirá o que os brasileiros mais bem informados já sabem: nos últimos 50 anos a Amazônia perdeu 17% da sua cobertura florestal.

Dá numa média de pouco mais de 22 mil quilômetros quadrados a cada ano, que resultou em desflorestamento de 615 mil quilômetros quadrados na Amazônia Legal, no curto período de meio século. É devastação sem paralelo na história da humanidade. Em conjunto, os biomas Amazônia, Mata Atlântica, Cerrado e a formação florestal Araucária foram privados de 3,6 milhões de quilômetros quadrados de cobertura vegetal.

Prevenindo os efeitos de uma divulgação mais ampla pelo mundo desse triste quadro, a partir da publicação do Guiness, algumas fontes têm insistido em lembrar que foi assim em outros países e continua a ser assim atualmente. Os Estados Unidos e a Europa se desenvolveram às custas da destruição de suas florestas.

O que resta da cobertura vegetal original americana, no noroeste do país, continua a ser posta abaixo pela indústria madeireira para a exportação.  Já a Europa começou a perder suas florestas ainda na Idade Média, por conta do crescimento populacional.

Essas mesmas fontes têm lembrado que embora o ritmo do desmatamento seja preocupante, o Brasil se tornou praticamente o único país do mundo a monitorar permanentemente áreas desmatadas, através de imagem de satélite. Graças a esse controle, está podendo acompanhar a destruição ecológica em tempo real, identificando os focos de queimadas tão logo irrompam os incêndios.

O resultado concreto da disponibilidade dessa importante ferramenta, no entanto, não tem sido proporcional às suas possibilidades. Mato Grosso é o Estado mais avançado da Amazônia em controle de desmatamento via satélite, mas é também o mais desmatado.

Esse descompasso mostra que não basta ter os meios técnicos e científicos para agir se falta a vontade de aplicá-los. O que distingue a Amazônia, detentora da maior reserva de floresta tropical do planeta, da história passada de devastação dos outros países, é que só agora a humanidade tem consciência do valor aproximado da riqueza contida na enorme biodiversidade da mata amazônica, a mais rica de todas. Por consequência, sabe o tamanho da perda que seguir a tradição de desmatamento representa.

O Brasil, nesse contexto, dispondo de um bioma como a Amazônia, podia inovar na história humana. Mas, como atesta o Guiness, precisou descartar o saber recentemente criado para adotar a insensatez anterior. Pelo ritmo das queimadas do verão deste ano, a edição do livro dos recordes terá que ser atualizada para 2006. Com dados ainda mais assustadores do que os que serão divulgados no próximo mês.

“Se houvesse um tribunal para julgar crimes contra a natureza, como há tribunais contra crimes de guerra, sem dúvida, seríamos condenados”, observou Enio Candotti, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), ao repórter José Hamilton Ribeiro, num dos últimos Globo Repórter da TV Globo. Triste papel, o do Brasil.

Discussão

5 comentários sobre “A história na chapa quente (350)

  1. Sempre é bom lembrar. As estatísticas comparando o Brasil com outros países foram distorcidas por um técnico da Embrapa que hoje é papagaio de pirata do ministro da agricultura. Ele não levou em conta o tempo que populações humanas viviam nestas regiões. Se medirmos a taxa de perda de floresta ao longo do tempo, não há duvida alguma que somos campeões mundiais.

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    Publicado por Jose Silva | 22 de janeiro de 2018, 23:50
  2. Pouco mudou, apesar das ações pirotécnicas dos arcos de fogo. No Pará, parece que houve uma melhora no nordeste Paraense, com Paragominas saindo de vilão para município verde.
    O mais preocupante nesses últimos 15 anos de “lari-lari” é que não se evoluiu nos controles e na conscientização, especialmente dos predadores do Pantanal, do Planalto Central, onde estão nossas principais fontes dos rios Tocantins, Xingu e Tapajós, que permanecem expandindo suas lavouras de soja pelas margens das nascentes e margens de riachos, igarapés e rios secundários que lá prosperam.
    O assunto está abandonado desde que Marina Silva foi excluída ou expulsa do ministério petista. Se antes não se fazia nada, agora não se tem nem notícias.

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    Publicado por JAB Viana | 23 de janeiro de 2018, 17:42
    • Isso é verdade. O agronegócio dominou o governo Lula depois que a Marina saiu, continuou no governo Dilma (com a Kátia Abreu) e se mantém no controle com o Temer (com o Maggi). Na lista das maldades, o não cumprimento do código florestal, o recorde mundial no uso de pesticidas poluindo rios e lagos, o desmatamento crescente, a tentativa de reduzir unidades de conservação e terras indigenas, e, claro, a tentativa de desvirtuar a lei contra o trabalho escravo. Na lista das bondades, para eles, estão mais subsídios, mais créditos facilitados e mais perdão de dívidas. É o setor econômico mais ineficiente do Brasil. Usa quase 34% do território para produzir menos de 10% do PIB. Se debitarmos os custos ambientais e sociais associados ao agronegócio, descobriremos que, como sempre, muitos estão pagando as contas de poucos.

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      Publicado por Jose Silva | 23 de janeiro de 2018, 19:25

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